Perfeita,
É a tua pele
Apesar de rugosa,
Que me ama
Desde que era lisa
Perfeitos,
São os teus lábios
Doridos pela vida,
Que me amam
Desde que eram sadios
Perfeito,
É o teu colo
Murcho pela velhice,
Que me ama
Desde que me alimentou
Perfeito,
É o teu nome
Que permanecerá sempre,
Que me ama
Desde que me gerou.
Autor: Jordão Silva
DEVANEIOS DE TINTA
"Deveríamos deixar a tela da nossa vida nas mãos do Pintor do universo." Jordão Silva
quarta-feira, 8 de julho de 2015
sexta-feira, 3 de julho de 2015
A CASA QUASE BRANCA
Cheguei àquela casa branca, acinzentada pela rigidez do tempo.
Enfileirados, aguardo pelo branco agora do leite, que nem todos bebiam.
Subindo os degraus de pedra que me levavam à sala, antecipava na imaginação o cerimonial do cantar do hino.
O rosto firme e rígido da senhora professora Dona Rosa Beatriz, ditava o entrar silencioso dos meus sapatos corroídos pela chuva.
De pé olhávamos uns quadros de figuras distintas do regime e das nossas gargantas ecoavam palavras trémulas, avermelhadas pelo frio.
Sentados, não mais havia espaço a murmúrios, perturbadores do silêncio.
O olhar adulto varria a sala.
Chamados ao xisto frio e escuro não havia espaço ao erro. A régua anestesiava as mãos empedernidas pelo frio. A dor e o calor irradiavam braço acima, morrendo por vezes no cotovelo hesitante.
-Não estudas!
Do rosto saltavam lágrimas que haviam ficado presas pela dor mas que se soltaram pela injustiça das palavras.
O tinteiro no meio da carteira ficava sujo pelas tremuras duma mão ainda ferida de injustiça. O mata-borrão tornava-se pequeno para dar cobro a tanta tinta derramada pelo medo.
De volta a casa, tirava os sapatos e as meias encharcadas.
Aquele escalda-pés assegurava que, no dia seguinte, a gripe não me iria visitar.
O almoço seguro estava servido. As garfadas dadas lembravam que as mesmas iriam faltar à dona dos afectos.
A tenebrosa chuva batia cruel na janela, chutada pelo vento.
A noite chega e escapa-se por entre sonhos de criança.
Nasceu um novo dia.
No estremecer da gélida manhã, calçava umas meias quentes de afeto.
Calçava um saco de plástico para enganar a chuva na sua entrada triunfante pelo enorme buraco nas solas.
Calçava os sapatos herdados do irmão do meio, que já havia herdado do irmão mais velho.
Com o dedo indicador escondia o plástico entre a meia e o sapato para os meus colegas não verem.
Estava bem. Quentinho.
-Despacha-te, já está a ficar tarde e não te esqueças de levar o guarda-chuva.
A chuva copiosa metia medo, mas à escola eu não poderia jamais faltar.
Ao fundo da praça, dita da Corujeira, para lá das folhas caídas e molhadas, estava a casa branca que, embora suja pelo medo, se mantinha limpa pela alegria das crianças que, como eu, adoravam ir à escola.
Autor: Jordão Silva
Enfileirados, aguardo pelo branco agora do leite, que nem todos bebiam.
Subindo os degraus de pedra que me levavam à sala, antecipava na imaginação o cerimonial do cantar do hino.
O rosto firme e rígido da senhora professora Dona Rosa Beatriz, ditava o entrar silencioso dos meus sapatos corroídos pela chuva.
De pé olhávamos uns quadros de figuras distintas do regime e das nossas gargantas ecoavam palavras trémulas, avermelhadas pelo frio.
Sentados, não mais havia espaço a murmúrios, perturbadores do silêncio.
O olhar adulto varria a sala.
Chamados ao xisto frio e escuro não havia espaço ao erro. A régua anestesiava as mãos empedernidas pelo frio. A dor e o calor irradiavam braço acima, morrendo por vezes no cotovelo hesitante.
-Não estudas!
Do rosto saltavam lágrimas que haviam ficado presas pela dor mas que se soltaram pela injustiça das palavras.
O tinteiro no meio da carteira ficava sujo pelas tremuras duma mão ainda ferida de injustiça. O mata-borrão tornava-se pequeno para dar cobro a tanta tinta derramada pelo medo.
De volta a casa, tirava os sapatos e as meias encharcadas.
Aquele escalda-pés assegurava que, no dia seguinte, a gripe não me iria visitar.
O almoço seguro estava servido. As garfadas dadas lembravam que as mesmas iriam faltar à dona dos afectos.
A tenebrosa chuva batia cruel na janela, chutada pelo vento.
A noite chega e escapa-se por entre sonhos de criança.
Nasceu um novo dia.
No estremecer da gélida manhã, calçava umas meias quentes de afeto.
Calçava um saco de plástico para enganar a chuva na sua entrada triunfante pelo enorme buraco nas solas.
Calçava os sapatos herdados do irmão do meio, que já havia herdado do irmão mais velho.
Com o dedo indicador escondia o plástico entre a meia e o sapato para os meus colegas não verem.
Estava bem. Quentinho.
-Despacha-te, já está a ficar tarde e não te esqueças de levar o guarda-chuva.
A chuva copiosa metia medo, mas à escola eu não poderia jamais faltar.
Ao fundo da praça, dita da Corujeira, para lá das folhas caídas e molhadas, estava a casa branca que, embora suja pelo medo, se mantinha limpa pela alegria das crianças que, como eu, adoravam ir à escola.
Autor: Jordão Silva
sábado, 27 de junho de 2015
POEMAS
Não escrevo as palavras
Que tu gostas de ler.
Escrevo o que sinto
O que não podes ver.
Se tu lesses o que leio
Tu lias o meu íntimo,
Mas enquanto interpretas
Não sentes o que eu rimo.
Autor: Jordão Silva
Que tu gostas de ler.
Escrevo o que sinto
O que não podes ver.
Se tu lesses o que leio
Tu lias o meu íntimo,
Mas enquanto interpretas
Não sentes o que eu rimo.
Autor: Jordão Silva
sexta-feira, 26 de junho de 2015
MUNDO DE AFETOS
Eram três da manhã e no meio da solidão da noite ouve-se uma voz rouca chamando...
-Mamã!
Do fundo de um túnel, ecoam vozes como que chamando múltiplas vezes...mamã... mamã....
O coração estanca o sangue nas veias e saltando da cama, diz para o marido anestesiado pelo sono ainda profundo...
-Não foi ela que chamou?
-O quê?...
Levanta-se inconformada com o descanso interrompido pelas vozes, veste o roupão e por entre as sombras dirige-se para o quarto da sua, sempre, bebé.
-Não me ouviste chamar? Barafusta a menina como se de outra possibilidade não houvesse e o atraso fosse uma eternidade.
-Eu ouvi-te filha! Justifica-se a mãe.
O pai incomodado pela luz que provinha do candeeiro, revolve os lençóis e barafusta. O som atravessa o quarto como um trovão, ecoa pelo corredor assustando os demais.
-O que foi aquilo? Questiona a menina, ainda assustada pelas sombras no quarto.
-Nada. Deve ser o papá nos seus sonhos..., tranquiliza a mãe, afastando a ideia de um pai resmungão.
-Dorme querida, que amanhã tens escola.
Fechando os seus olhos, entrega na solenidade da noite e nos braços da sua mãe todo o seu descanso e todo o seu mundo.
E, desta forma, se constrói entre ambas um mundo de afetos.
-Mamã!
Do fundo de um túnel, ecoam vozes como que chamando múltiplas vezes...mamã... mamã....
O coração estanca o sangue nas veias e saltando da cama, diz para o marido anestesiado pelo sono ainda profundo...
-Não foi ela que chamou?
-O quê?...
Levanta-se inconformada com o descanso interrompido pelas vozes, veste o roupão e por entre as sombras dirige-se para o quarto da sua, sempre, bebé.
-Não me ouviste chamar? Barafusta a menina como se de outra possibilidade não houvesse e o atraso fosse uma eternidade.
-Eu ouvi-te filha! Justifica-se a mãe.
O pai incomodado pela luz que provinha do candeeiro, revolve os lençóis e barafusta. O som atravessa o quarto como um trovão, ecoa pelo corredor assustando os demais.
-O que foi aquilo? Questiona a menina, ainda assustada pelas sombras no quarto.
-Nada. Deve ser o papá nos seus sonhos..., tranquiliza a mãe, afastando a ideia de um pai resmungão.
-Dorme querida, que amanhã tens escola.
Fechando os seus olhos, entrega na solenidade da noite e nos braços da sua mãe todo o seu descanso e todo o seu mundo.
E, desta forma, se constrói entre ambas um mundo de afetos.
Autor: Jordão Silva
OUTROS DEVANEIOS
Estava aqui perdido entre blogues esquecidos no nevoeiro do tempo e deu-me saudade dos tempos em que "blogar" era próprio de quem queria emancipar-se na escrita, no desabafo.
Entre prosas e poesias, pensamentos, devaneios e desabafos, espero encontrar quem os leia na certeza de que lerá por vezes um pouco de mim.
Os meus textos não são autobiográficos embora por vezes belisque momentos vividos, mas serão frequentemente biográficos no meu imaginário com vidas com vida que lhes darei.
Por vezes, a escrita dá vida à vida que não se escreveu em nós.
Voltem sempre!
Entre prosas e poesias, pensamentos, devaneios e desabafos, espero encontrar quem os leia na certeza de que lerá por vezes um pouco de mim.
Os meus textos não são autobiográficos embora por vezes belisque momentos vividos, mas serão frequentemente biográficos no meu imaginário com vidas com vida que lhes darei.
Por vezes, a escrita dá vida à vida que não se escreveu em nós.
Voltem sempre!
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